segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

“As (minhas) mulheres de 80 anos…”




As mulheres de 80 anos sentam-se em todas as cadeiras
como se estivessem sentadas em tronos. Podem ter anéis
nos dedos, como podem ter lenços de assoar nos bolsos.

Em natais, festas de aniversário com pão-de-ló, ou em
casamentos, as mulheres de 80 anos reúnem uma
assembleia de afilhadas solteiras e explicam-lhes

que a vida é transparente e que o passado, fechado em
armários que rangem durante a noite, brilha às vezes, como
as pratas dos chocolates que entregam nas mãos das crianças.

(José Luís Peixoto, cal, Bertrand Editora, 2007)


As (minhas) mulheres de 80 anos, ainda, não tinham 80 anos
tinham 40, 50 anos. De nada.

A fadiga quebrava-lhes o corpo e à noite mal se sentavam
no tropeço adormeciam

e esperavam pelos seus homens. Da taberna
ou do fundo das Minas.

−As minhas mulheres de 80 anos estão vivas da memória e
acariciam os bancos de cortiça de arestas arredondadas pelo tempo.

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